César Nunes | César Nunes

O ano de 2016 e a Educação como direito subjetivo e social.

A educação básica do Brasil precisa ser prioridade nacional. O Plano Nacional de Educação tem 20 metas e 254 estratégias para a produção de um novo padrão de serviço público educacional e de uma nova vivência da educação escolar, como direito subjetivo e social. Não se trata mais de entender a educação como mediação para o trabalho ou para uma cidadania tutelada. A cidadania viva e real que aspiramos é aquela que nos engendra como pessoas, como seres sociais e culturais, plenos de direitos e da consciência deles.

Mas, nem sempre foi assim. A educação e a escola, no Brasil, ressentem-se de identidades autoritárias, plasmadas por formações econômicas e políticas de dominação, de inculcação ideológica e de padronização comportamental. Nossas matrizes culturais expressam este nicho estrutural. A escola só encontra as chaves de sua decifração na prática social. Não se explica a escola pela escola e seus regimentos, seu currículo, sua identidade institucional. Quem quiser decifrar a educação e a escola terá que estudar a sociedade que a definiu e a mantém.

A vivência, ainda que tênue e curta, de um novo processo social e político, inaugurada pela conquista do estado de direito, formalmente marcado pela promulgação da Carta Constitucional de 1988, já condensa uma nova configuração jurídica para nossa realidade brasileira. O Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, o Estatuto da Juventude, a Lei Brasileira da Inclusão, a Lei Maria da Penha, a conquista da obrigatoriedade da educação escolar de 04 a 17 anos, determinada pela Emenda Constitucional 59, o Plano Nacional de Direitos Humanos, o reconhecimento da União Estável de Pessoas do mesmo sexo, o casamento civil homossexual ou homoafetivo, as políticas de reparação, o reconhecimento da dignidade plena da condição do negro no Brasil, a política de proteção ambiental, a demarcação de terras indígenas e quilombolas, o Código Florestal Brasileiro, o Plano Nacional de Educação, com a indicação de 10% do PIB para o financiamento da educação brasileira, entre outros dispositivos, revelam a efervescente revolução jurídica e cultural engendrada no âmago da sociedade e da cultura de nosso país.

Eu prefiro ver a “terceira margem do rio”! Considero a realidade da política, levo em consideração a dinâmica da economia, mas, para mim, a sociedade civil brasileira se estrutura sobre uma nova base: o direito de todos, a tolerância, a diversidade, o “ethos” republicano. Esta mudança se dá em cada embate cotidiano, em cada frente de lutas, todo dia, em todos os cantos e antros deste nosso país. Temos que ter clareza que a legitimação destes novos direitos civis e o empoderamento destes novos sujeitos sociais é um processo demorado, feito de avanços e recuos, passos e descompassos. Mas, ninguém consegue parar o tempo, nem a marcha da história, nem a força das contradições!

Em 2016 teremos outros campos e outras atalaias para defender o que já conquistamos, com a firmeza de quem sabe o preço destas conquistas, na consciência de nossa história cruel e excludente. A escola, como espaço de humanização e de formação para a cidadania, cultural e política, deverá tomar parte deste debate, desta construção, na direção da educação que emancipa e que produz o homem e a mulher para a vida em sociedade!

Mas é preciso ser revolucionário no conteúdo e na forma. Fazer acontecer a história da emancipação e da libertação de todos os grupos, subjugados e oprimidos, com traços de humanização e de superação, na direção da utopia! Em 2016 estaremos novamente atentos, para fazer valer a luta dos que deram o melhor de si, suas idéias e movimentos, alguns deram mesmo a própria vida, para que pudéssemos hoje viver o que estamos vivendo e ver o que estamos vendo acontecer! Para levar adiante estas causas, de humanização e de cidadania, com nossa consciência lúcida e crítica, seguida de nossa vontade esperançosa e propositiva!

Da dimensão pública e da natureza da publicidade ou ainda Da dimensão privada e da natureza da privacidade

Tenho pensado muito em escrever algumas considerações sobre a questão das dimensões públicas e privadas de nossa condição social e particular. Vivemos em sociedade, todas nossas ações e todo nosso ser está marcado por esta causa eficiente: somos processo e produto da prática social. Mas, dialeticamente, somos sujeitos, no sentido de assumir uma identidade, ainda que seja uma esfera aberta, histórica, como nosso fulcro identitário, ao mesmo tempo em que somos assujeitados, isto é, submetidos, seja pela educação, pela cultura, pela história. Estas duas dimensões articulam-se em nossa identidade cultural, polimórfica, polifônica, pluralista. Mas, para dar conta do peso existencial que nos abate, constituímos espaços menores, particulares, que significa ” o que é próprio de uma parte”, outros denominamos singulares, que dizem respeito ao pessoal, ao “singular”, ao próprio de cada um. Há dimensões sociais e coletivas, grupais e particulares, pessoais e subjetivas. Cada uma destas dimensões da realidade deveria ser, amiúde, bem compreendida e bem vivenciada.

Eu não abomino a dimensão social, seria uma forma de negação falsa, já que a dinâmica da vida social e da sociedade nos constitui. Mas eu acredito na necessidade de espaços prioritários de segurança afetiva, de desvelamento irrestrito, de calmaria, sem exposição, sem controles extremados, que são os espaços de privacidade, no sentido cultural e psicossocial, como a família, como o círculo de amigos, como os lugares de paz, o deleite do passeio, a praça, os jardins que gosto, a igreja. Nestes espaços eu conheço pessoas, cumprimento uma e outra, riem para mim, acenam, perguntam sobre a gripe, sobre meus filhos etc. Convivo há mais de 3 décadas com estas pessoas. São minha riqueza privada. Viver bem no ambiente privado, neste sentido cultural, no mundo da vida, é uma virtude. E um direito!

Hoje há uma ansiedade para ser visto. Sei que todos precisamos de muitas destas coisas, mas algumas pessoas, sem avaliar bem, extrapolam as dimensões, confundem os ambientes, desarticulam as identidades. Tomam o que é público como se fosse particular ou subjetivo. Desta esquizofrenia ética e política deriva a corrupção, o crime, entre outros fatores. Mas há pessoas que apropriam-se das privacidades (dos outros) como se fossem coisas e objetos públicos, de todos ou para todos! Equivocam-se!

Hoje há a questão das fotos públicas! Gosto de fotos, autorizo que coloquem fotos minhas nas páginas pessoais, como uma forma de convívio, uma distinção, um acolhimento. Aceito todos os carinhosos pedidos, faço poses para fotos. Meu trabalho é público, a atividade ali é pública, não vejo nenhum obstáculo ou dificuldade em tirar e publicar fotos de dimensões e de atividades definidas como públicas. No meu trabalho, a natureza da ação é pública, as fotos registram os olhares, as impressões, os acolhimentos das pessoas ao meu agir, às minha idéias, textos, discursos etc! Todas as fotos públicas eu as cultivo como públicas, as valorizo e respeito!

Mas não gosto de fotos que expõem dimensões privadas, pois a natureza destes espaços é outra! Uma festa de amigos, uma festa em família, um jantar, um churrasco, um batizado, uma celebração – são dimensões particulares, são de um grupo de pessoas, não são públicas, não são, a priori, para todos. Fotografar, com autorização, estes acontecimentos, é parte de nossa cultura. Até mesmo publicar, aqui e acolá, uma ou outra foto, pode até ser visto como uma forma de divulgação. Com limites. Mas deleitar-se em expor fotos, definitivamente privadas, no espaço público, para mim é ume relativa confusão. Eu queria pensar que conviver com alguém, no âmbito privado, é tão grandioso, muitas vezes, que somente a liturgia de estar juntos seria o prêmio, a compensação afetiva. Não há tanta necessidade desta ansiosa e impulsiva vontade de publicizar as coisas do cotidiano, da vida comum e boa do dia a dia! O particular deveria ser visto por aqueles que vivem naquela parte, naquele espaço privado. O singular é da pessoa. Descartes escreveu a famosa tese da modernidade racionalista: Penso, logo existo! Hoje parece que mudamos estruturalmente o texto para: Sou visto, logo existo!

César Nunes

A Cultura é que nos faz humanos! A Cultura nos Humaniza!

Quero abrir aqui uma reflexão coletiva sobre Cultura. Mas, que seja feita em alto grau de fundamentação. Não se pode perder tempo com conceitos alienados, rudes, ideologicamente colonizados. O conceito de “cultura” nos ensina muitas coisas! Aprendi com Alfredo BOSI. O verbo latino “colere” significa “cultivar”, “arar a terra”, “revolver, plantar na terra”. Um sentido bem material, bem real, sem nenhuma abstração inicial.  Reporta-se às condições do homem na fase de sedentarização, quando necessita produzir os meios de sua subsistência na terra, em condições de exploração agrária, teria que inventar a agricultura e fixar moradia e proteção coletivas. Ao “cultivar” a terra os grupos humanos extraem da terra sua sobrevivência. Esta é a premissa basilar. Os homens estão fadados a produzir os seus meios de sobrevivência material. Transformar a natureza para saciar suas necessidades!

O particípio passado do verbo latino “colere” é a palavra “Cultus”, que significa: “o que já foi cultivado, o que já foi explorado, o que já serviu de vida para todos”. Nas regiões e nas terras já esgotadas, noutras de difícil trato agrícola, ou naqueles espaços marcados por especiais condições,  tais como os morros, colinas, alguns penedos, costumava-se enterrar os mortos, sobretudo com marcas de fácil reconhecimento e que eram rigorosamente observadas e consideradas como sagradas para os grupos humanos. O primeiro rito religioso genuinamente humano é o reconhecimento do culto aos antepassados, aos mortos. O “culto” se expressa aqui, o  ethos da religião é o culto aos mortos, o reconhecimento da “terra que já cultivada”, que já “serviu e alimentou o grupo”.

O particípio futuro do verbo latino “colere” é “Culturus”, que significa: “o que se deve ensinar aos pequeninos, às crianças, aos jovens, para que eles possam cultivar a terra e reproduzir a vida social, material, econômica e espiritual do grupo”. Cultura vem desta raíz. Cultura é a dimensão histórica, social e grupal, da vida humana em sociedade. Sem cultura não se realiza a dimensão do agir humano em sociedade: presente, passado e futuro! A cultura é a consciência material e coletiva da ação humana, na cultura está a identidade dos grupos humanos!

Cultura é tudo o que os grupos humanos e as pessoas produzem. Tudo o que o ser humano faz e realiza é cultura! Tanto quanto trabalhar e pintar, fotografar e cantar, escrever e chorar, rezar e amar, fazer casas e usar brincos, contar os dias e olhar a lua, registrar poesias e pintar nas cavernas as cenas de caça – tudo, absolutamente tudo isso é a produção social da condição humana!

O primeiro passo, na direção certa, já é a metade do caminho!

O primeiro passo, na direção certa, já é a metade do caminho!
Esta bela frase, como uma criteriosa máxima, derivada de uma iluminada filosofia de vida, é atribuída ao sábio oriental Lao-Tsé. Tenho muito apreço e admiração por este pensador, e pelas tantas frases ou fragmentos de seu pensamento, que permaneceram vivos na memória da civilização e da cultura humana universal. Ela me ajuda agora a realizar uma importante escolha! A decisão de assumir a tarefa de criar, de alimentar e de manter ativo e atualizado, um espaço de debates virtuais, um denominado blog, foi muito difícil! Explico as minhas razões. Gosto muito de escrever, sinto uma alegria imensa ao sentir que as pessoas acolhem e demonstram generosas ressonâncias sobre minhas pequenas postagens nas redes sociais, sobre alguns comentários que redijo na minha página pessoal, no endereço www.facebook.com/profcesarnunes ou em outros espaços, reais e virtuais, de comunicação e de diálogos. E, por gostar de escrever, tenho receio de escrever por demais, de não saber o limite, de estender por demais os textos, enfim, de acabar sendo impertinente e desmedido. Minha geração é conhecida por ser uma gente exagerada! Outro receio, o de não dar conta das coisas, de não corresponder ao ideal de um blog, de não saber responder às eventuais demandas, no tempo tão rápido, dinâmico e vertiginoso, da vida de hoje. Também não queria cair no pantagruélico mundo de banalidades e veleidades sem sentido. Tenho dúvidas de conteúdo e de forma! Fiquei meio perdido entre a projeção ideal e as dificuldades reais. Mas, ao cabo destas dúvidas, acabei sendo convencido de que deveria tentar escrever este blog! E decidi começar hoje, dia 11 de janeiro de 2016, dia em retomo minha exigente agenda, agora para o ano de 2016! Quero muito que seja um espaço de comunhão de ideais, de fortalecimento de convicções, de franqueza e de lealdade nas divergências, mas, sobretudo, de respeito à diversidade, ao pluralismo, à pluralidade de toda sorte e natureza. Espaço de acolhimento e de alegria, pontuado por debates, por opiniões e ressonâncias, por comentários e apontamentos, alguns criteriosos e conceituais, outros mais leves, próprios da primícia dos acontecimentos, alguns carregados de argumentações, outros como olhares, muitas vezes ainda impregnados pela força de nossa realidade! Como Lao Tsé dizia, sabiamente,
(…) um caminho de mil léguas começa com um primeiro passo! E este primeiro passo, na direção certa, já se traduz na metade do caminho!
creio que já demos juntos o primeiro passo. Venham comigo nesta caminhada!
César Nunes